segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Chermont o "Darrel" Rodrigo.

Aos 19 anos pelo que me lembro  conheci um certo cabeludo metido a rockstar que tinha uma fama de "encrenqueiro " no bairro de maranguape 1 PAULISTA/ PE. "É uma má companhia eles diziam", hoje  em dia me pergunto o que é de fato uma má companhia?  Pelo que me lembro desde o primeiro contato com o  famoso" Chermont" apesar das divergências de personalidade, o que é natural entre duas pessoas de ambientes familiares e experiências pessoais diferentes, seu modo de se comportar  com as pessoas próximas sempre era de algum modo "afável" e solicito  mesmo que por muitas vezes talvez estivesse destruido por dentro. E mais uma vez como acho até hoje   somos julgados por escolhermos modos de vida e caminhos de fazermos a nós proprios felizes diferentes do que o costume moral da sociedade quer nos impor, mas mesmo dito isto seria possivel ser feliz de forma plena? Chermont sabia que não, talvez por isso tinha seus momentos melancólicos e assim como ele se foi todos nós partiremos, a vida é efêmera, disso ele tinha plena consciência o tempo inteiro. Também não digo que era "santo" assim como eu também nunca fui, talvez por isso  me identificava com sua companhia e diante disto dividi vários momentos que posso dizer foram alguns dos momentos mais felizes alegres e engraçados da minha vida, bar do metal, jogos de war e conversas na calçada regadas a vinho entre outras coisas. As lembranças que ficam são de, um otimo amigo, um músico virtuosissimo de talento animal, e um cozinheiro de mão cheia, Chermont vai em paz amigo, foi um prazer dividir parte da vida com você, ao som de "Pride" Damageplan, me despeço...

Alberto Kelevra

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Cioran, angústia e ceticismo.


Cioran, angústia e ceticismo.

Discutiremos a possibilidade de uma noção de angústia em Emil Cioran que estaria relacionada com o entendimento de uma vida radicalmente desprovida de sentido a partir do ato de filosofar.  Discutindo a partir do seguinte aforismo; “O ceticismo é o último brado de coragem da filosofia, para além dele só existe o caos” compreendemos que o conceito de caos em Cioran se relaciona em alguma medida com o sentimento de angústia e pode servir ao ato do filosofar dentro das concepções limítrofes do ser humano.
Palavras-chave; Angústia, ceticismo, caos.
  • Cioran nos disse certa vez em o breviário de decomposição que; “enquanto continuarmos a acreditar na filosofia manteríamos a saude e que seriamos irrompidos pela doença ao começar a pensar” Não seria um tipo de paradoxo?  O próprio ato de filosofar não seria ele mesmo o ato de raciocinar? Para Emil Cioran em um sentido completamente majoritário a Própria filosofia seria um tipo de teologia, não só ela assim como várias atividades humanas que são criadoras de sentido para um mundo sem sentido, ou seja, neste contexto para o filosofo o ato de raciocinar estaria ligado a ter noção diante da finitude assim como da total falta de sentido da existência.
  • A questão fundamental aqui se dará em relação a possibilidade de entender como poderíamos utilizar o sentimento de angústia e de falta de sentido de um cosmos cioranico para uma superação da própria concepção do filosofar.
  • Ainda aqui Cioran nos faz refletir paradoxalmente em relação a como ao mesmo tempo que precisamos de sentidos para continuarmos a afirmar a existência, inclusive para o próprio ato filosófico, a falta dele poderia nos conferir um filosofar de parâmetros mais autênticos e não nos fazer ceifar a existência e ainda nos provocaria um debruçar sobre aquilo que Cioran consideraria um ceticismo crítico.
A angústia e situações limite
A filosofia do ceticismo crítico se pretende afirmar como um tipo de filosofia que reflete e age diante de situações e conceitos limite, ou seja, temas caros a humanidade. Em outras palavras referente as situações que consideraríamos mais angustiantes no que se confere a relação intrínseca com nossas vidas, como por exemplo temas como Deus, a morte, a loucura ou a violência. O ceticismo crítico em seu aspecto negativo não se pretenderia afirmar como um substituto dogmático, ao menos não tanto quanto a prisão "teológica" de uma visão positiva da realidade.
 Fatalidade e Diógenes de Sínope
A figura de Diógenes de Sínope o cínico seria um grande exemplo da concepção limite contida na interpretação negativa da realidade de Cioran, negativa no sentido de sempre se colocar como um grande desafiador do caos,  que seria uma postura cética para o romeno, que sempre se colocaria diante da possibilidade de um estado caótico mesmo que sendo tendencioso de uma forma mais forte a este estado, o cético assim como o cínico Diógenes, não cristalizaria o estado de caos, ele por vontade própria sempre se colocaria em uma condição limite por disposição, e não por acreditar ser a única realidade experimentável ou ainda por sempre tender a uma interpretação agradável da realidade, muito pelo contrário.  Diante disto a partir da concepção filosófica de Emil Cioran estaria o livrar-se das amarras de noções ilusórias como por exemplo o apego a conceitos de passado e futuro aos quais tanto nos amarraríamos emocionalmente, ou seja, despertando um sentimento de angústia diante daquilo que chamaríamos fatalidade ou o inevitável, o fato já consumado, aquilo que de fato não podemos contornar e que está presente em todas as coisas, e da qual não poderíamos fugir por mais frustrante que algo nos pareça. Ao sermos contaminados pelo ceticismo crítico seríamos inclinados a sobreviver as mais fortes sensações de angustia mesmo diante do vazio completo, ao menos na visão do romeno. Neste sentido sobreviveríamos a nos mesmos de modo opcional por uma tendência a este modo de pensar, inclusive diante da sensação inconveniente do existir. Só a angustia diante da morte sustentaria o raciocinar para o filósofo, não a morte em si, mas a implacável obsessão pela mesma.

Referências;
Breviário de Decomposição, tradução do francês de José Thomaz Brum, Editora Rocco, 2011
O Livro das Ilusões, tradução de José Thomaz Brum, Editora Rocco, 2014.

A MORTE NA FILOSOFIA DE E.M CIORAN: Caminhos para o niilismo ABREU, Jheovanne Gamaliel Silva de.1 LIRA, Luédlley Raynner de Souza

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Perspectivas do perspectivismo - Nietzsche

https://www.spreaker.com/user/10928444/perspectivas-do-perspectivismo-nietzsche

Link para o podcast acima


“Perspectivismo” é a designação corriqueira para a suposta
teoria do conhecimento de Nietzsche, cuja idéia básica resume-se
nas seguintes palavras: “não há fatos, apenas interpretações”
Abordaremos no podcast ;
1) perspectivismo me-
tafísico, 2) perspectivismo hermenêutico-fenomenológico, 3) perspectivismo
transcendental, 4) perspectivismo semântico e 5) perspectivismo pragmático.

sábado, 2 de fevereiro de 2019

LÓGICA MODAL, MUNDOS POSSÍVEIS E ETERNO RETORNO


MUNDOS POSSÍVEIS E ETERNO RETORNO

A noção de mundos possíveis pode se dividir em três concepções iniciais de acordo com Plantinga; modos pelos quais as coisas poderiam ser, modos pelos quais o mundo poderia ser, e possíveis estados de coisas.  Porém estas subdivisões não podem ser consideradas de forma arbitrária, a necessidade lógica emite condições definidas que estão ligadas a possibilidades físicas e metafísicas para considerar a possibilidade de configuração de um mundo possível logicamente aceitável, de acordo com as próprias leis da lógica, a nível de exemplo não poderíamos dizer que; João descobriu a “quadratura” de um círculo pois é logicamente impossível considerar esta possibilidade em qualquer mundo possível logicamente falando.
Tentaremos aqui neste artigo de forma a não esgotar as possibilidades existentes do tema de forma sucinta ( até mesmo por ser improvável para mim) verificar a possibilidade ou impossibilidade de enquadrar um questionamento que adentre as noções da relação ontológica e da correspondência destas mesmas com as ideias mais básicas da lógica, como por exemplo a de não comprometimento ontológico, tentaremos aqui ainda aqui pretensiosamente ver como um recorte da filosofia nietzschiana que seria totalmente contraria a um tipo de cristalização do pensamento humano, em se tratando de criação de conceitos logicamente racionais, superiores, fixos e supostamente mais adequados para descrever o mundo presente ou os “mundos possíveis” ( me refiro ao período mais maduro dos escritos de Nietzsche) pode sim, mesmo que involuntariamente colaborar para uma expansão da percepção destas noções lógicas a partir  de um sub conceito da sua reflexão acerca do eterno retorno diante de um de seus fragmentos póstumos onde surge  a noção de situação global que se assemelha  a noção de mundos possíveis.
Em “Textos de 1881” em um de seus fragmentos póstumos Nietzsche tenta justificar a plausibilidade de sua tese do eterno retorno atacando a interpretação da possibilidade de infinidade do mundo presente em vista de uma situação global por vir(uma interpretação de mundo possível) no qual haveria uma imensurável quantidade de combinações possíveis a partir da materialidade (imanência) entendendo que a materialidade é esgotável e modificável (devir), porém aquilo que possibilita o exercer das combinações materiais que seria o tempo e as forças que se exercem sobre essa materialidade  sempre estiveram aí, o que traz uma possibilidade interpretativa de que aquilo que consideramos mundos possíveis dentro de uma concepção ligada a noções físicas (para Nietzsche físicas ou materiais, apesar de ser questionável do ponto de vista cosmológico da interpretação da filosofia nietzscheana) esta permeada por uma série de combinações delimitadas materialmente, ou seja para Nietzsche em duas situações globais diferentes é impossível encontrar dois sujeitos iguais ou  que sejam ao mesmo tempo na mesma situação global iguais, partindo do pressuposto que a ordem material das coisas no mundo é limitada e se reagrupam de maneira infinita devido a estarem impulsionadas por forças ( vontade de potência) e pelo tempo que é infinito ( perspectiva influenciada pelos estoicos). Dito isto, a materialidade limitada em determinada condição de situação global possível e necessária para Nietzsche impulsiona a necessidade que também determinada estas combinações, então jamais em uma mesma situação global poderia haver dois sujeitos ou duas matérias iguais pois em cada condição global cada um destes anteriormente citados só poderia ser igual a si devido a sua limitação material e condição de mundo possível.
Então a noção de mundos possíveis entraria em um comparativo numa concordância com às regras da lógica, de como as coisas são ou podem ser. Ou seja quer dizer que esse tipo de linguagem (mesmo a distância e discordância das concepções de verdade e linguagem em Nietzsche sendo evidentes) visa abarcar tudo que é logicamente possível incluindo tudo que realmente há. Deste modo tentando compreender tudo que seja logicamente possível dentro de uma percepção de mundo, mesmo em Nietzsche anti-lógico por natureza. Então o que seria logicamente possível?  Voltemos ao básico, a possibilidade lógica seria tudo aquilo que não é uma contradição lógica básica, como a proposição P¬P é uma contradição lógica. Para tornar mais clara essa sentença basta substituir P por A grama é verde: Assim, P¬P A grama é e não é verde. Só que na noção de situação global em duas noções de mundos possíveis ou duas situações globais que estiverem propensas a assumir noções de igualdade de identidade de um mesmo indivíduo sendo igual a ele mesmo seria um equívoco pois para ser igual a ele mesmo seria necessária estar dentro do mesmo mundo possível e isso só seria possível dentro de cada situação global. Então para algo ser igual a si mesmo é imprescindível que esse algo esteja organizado em uma mesma noção global ou mundo possível, seja no passado presente ou futuro com uma possibilidade de organização de estados de coisas ou de modos de como o mundo poderia ser, pressupondo uma determinada “essencialidade” destas coisas particulares delegada a cada mundo possível como conceito fundamental de identidade para aquela realidade lógica pressuposta.

A QUESTÃO FISIOLÓGICA EM NIETZSCHE O RESSENTIMENTO E POSSÍVEIS APROXIMAÇÕES COM MARX.


A partir desta comunicação temos a pretensão mesmo que sucinta de produzir uma análise da possível relação entre a polêmica análise fisiológica em Nietzsche dentro do contexto da genealogia da moral e o conceito de ressentimento, tentaremos entender como podem se relacionar estes conceitos. Pretendemos também de acordo com o contexto hermenêutico histórico tentar compreender como Marx poderia dialogar com Nietzsche mesmo havendo vários contextos totalmente antagônicos entre os mesmos.  Entendemos que estes três pilares nos fornecem possibilidades para uma transvaloração dos valores diante de uma superação do anti-intelectualísmo que a nosso ver influencia totalmente o cenário político atual produzindo um tipo de niilismo no sentido nietzscheano mais geral e que nega o único real possível ou seja a imanência, nossa intenção é tentar confirmar esta hipótese ao final do desenvolvimento do texto ou talvez verificar que  existam contradições na nossa hipótese e que existem lacunas a serem preenchidas na análise.


A questão fisiológica e o ressentimento

O  aspecto  fisiológico  irá  gerar uma  constante  polêmica interpretativa  em torno da filosofia de Nietzsche principalmente entre seus críticos, não há de se negar que  Nietzsche leve em consideração os aspectos fisiológicos para tratar de questões fundamentais relacionadas ao comportamento moral do homem e na verdade diante de tudo aquilo que  se relacione  ao mesmo, porém de um modo  geral a seu ver os sintomas fisiológicos se dão a  partir  de  variações também psicológicas ( que não deixam de ser fisiológicas) do forte e do fraco, mas diante de nossa constatação há um obscurantismo quando se totaliza este contexto fisiológico a um tipo de eugenia totalitária excludente. A relação  da  afirmação do corpo em Nietzsche como aspecto afirmativo fisiológico vai nos trazer um tipo de filosofia que se propõe a negar todos os valores possivelmente transcendentes, de acordo com este preceito poderemos averiguar segundo o mesmo que tipo de vida pode ser compreendida como saudável ou como doentia e desta feita a fisiologia nietzscheana não se  relaciona com algum tipo de característica inata biológica que priorizaria determinadas raças como superiores.


Aos desprezadores do corpo desejo falar. Eles não devem aprender e ensinar diferentemente, mas apenas dizer adeus a seu próprio corpo – e, assim, emudecer. “Corpo sou eu e alma” – assim fala a criança. E por que não se deveria falar como as crianças? Mas o desperto, o sabedor, diz: corpo sou eu inteiramente, e nada mais; e alma é apenas uma palavra para um algo no corpo. Corpo é uma grande razão, uma multiplicidade com um só sentido, uma guerra e uma paz, um rebanho e um pastor. Instrumento de teu corpo é também tua pequena razão que chamas de “espírito”, meu irmão, um pequeno instrumento e brinquedo de tua grande razão(Nietzsche-Assim falava Zaratustra)


A fisiologia para a biologia assim como para o senso comum trata de  aspectos ligados a características genéticas herdadas, assim como de certo modo em Nietzsche, porém não se  resume a isto, no contexto da filosofia do nosso pensador, a fisiologia pode se entender como um processo orgânico do corpo humano que agrupa diversas condições e expressões no terreno das experiências vitais; nestes termos, a noção de “fisiologia” está ligada a vários processos do organismo como um todo e engloba os instintos e a vitalidade, incluindo os  aspectos  físicos e psicológicos, esta fisiologia em Nietzsche inclusive se apresenta segundo seu diagnóstico como manifesto das construções culturais de um povo e de determinados costumes de uma época sempre em um certo tom de suspeita.

Com relação ao nosso problema, que por bons motivos pode ser chamado um problema silencioso, e que de maneira exigente se dirige a bem poucos ouvidos, é de interesse nada pequeno constatar que, nas palavras e raízes que designam o "bom", transparece ainda com frequência a nuance cardeal pela qual os nobres se sentiam homens de categoria superior.. (NIETZSCHE, 2012. p. 26).

     Deste modo esta fisiologia que se manifesta  em um tipo de construção comportamental  metafisica e cultural que disponibiliza ferramentas para justificar posicionamentos sociais e políticos por exemplo moralmente infectados, por um tipo de niilismo que prefere acreditar no nada  de que em  nada acreditar, afirmando esse nada baseado na negação do outro como detentor destas forças ativas, o entendendo como algo diferente das minhas características que são consideradas boas e justamente o que acaba por determinar um modo de agir moral único. A partir disso surgem as classificações do que se pode considerar mau ou bom seja através do aparecimento da chamada moral de senhor e da moral de escravos disseminando estas visões em sistemas coletivos morais fixos. Detalhando este contexto pressupomos então que o senhor neste contexto inicial possui um tipo de ação irrefletida a partir de si pois pode se dar ao luxo para tal e se afirma como bom pois predomina e vê o escravo como alguém que é distante de si nas ações e nas suas possibilidades, por isso é mau, o denominando como tal através de uma determinação de caráter traçada pelo destino, já os considerados fracos mesmo que ainda não necessariamente escravizados psicologicamente já antecipadamente sofrem com a atitude irrefletida do senhor através de sua moral impositiva, como consequência deste sofrimento os escravos ou fracos aderem um tipo de racionalidade a sua visão de mundo e em relação a visão de  mundo do senhor ou seja ressignificam, isso despertará naquele que tem moral de senhor a necessidade de justificar o comportamento opressivo e desta necessidade de reação surge outro pressuposto moral a partir do senhor se pautando na seguinte questão; cada qual cativa pra si aquilo que lhe é merecido, se procuras ser fraco pois só podes o ser jamais poderás atrair algo de diferente para si. A moral escrava se aproveitando deste pretexto faz surgir uma transvaloração dos valores daquilo que  pode ser considerado bom ou mau, o escravo necessita gritantemente desta opressão ou determinação de caráter dos senhores sobre si para poder projetar seu ressentimento através de um subterfúgio e usar a estagnação ou inação como algo de superior e assim se afirmarem com veemência de forma  mais perversa ; nós os fracos somos bons e  vocês são maus pois nos oprimem e isso nos garante uma identidade diferente daqueles aos quais buscamos superar isso nos faz superiores por sermos incapazes de reagir e ao mesmo tempo nos faz reagir da forma mais sorrateira.

Estes são todos homens do ressentimento, estes fisiologicamente desgraçados e carcomidos, todo um mundo fremente de subterrânea vingança, inesgotável, insaciável em irrupções contra os felizes, e também em mascaramentos de vingança, em pretextos para vingança: quando alcançariam, realmente o seu último, mais sutil, mais sublime triunfo da vingança? Indubitavelmente, quando lograssem introduzir na consciência dos felizes sua própria miséria, toda a miséria, de modo que estes um dia começassem a se envergonhar da sua felicidade, e dissessem talvez uns aos outros: ‘é uma vergonha ser feliz! existe muita miséria!’…” – Nietzsche, Genealogia da Moral, 3a. parte, §14.

     Dito tudo isto no que consiste o ressentimento? Se trata de sentir algo que já ocorreu e que retorna ao nosso sentir? O entendendo nestes termos o poderíamos considerar algo pejorativo? Será nos escritos de Duhring que Nietzsche achará de certo modo pretextos para elaborar sua crítica ao modo de se comportar ressentido onde Duhring trabalha aspectos ligados ao surgimento da chamada justiça, partindo da tese de que a mesma teria sua origem em um sentimento de vingança ou um tipo de nivelamento entre os seres sociais e de forma mecânica. Posteriormente Nietzsche ao se deparar com as reflexões psicológicas de Dostoievski vai expandir esta noção de ressentimento entendendo que o ressentimento pode sim ser utilizado não como um movimento mecânico, mas como um tipo de má digestão psíquica que pode se tornar como um tipo dispepsia de ordem criativa desembocando no alvo de seu apontamento de que há vontade de potência em todo tipo de comportamento moral sobretudo na moral ressentida. Fazendo um paralelo com a nossa cultura em transição porém vigente trago um resumo de um trecho de Assim Falava Zaratustra que aborda uma reflexão de acordo com nossa interpretação que afirma que não há uma relação com condições de raça ou relações sociais como por exemplo na relação empregado ou empregador e sim com o modo de se relacionar com o que acontece fora de si com o diferente ou seja a capacidade de rir destas contradições e aceitá-las dilui-las no organismo para um modo de vida saudável o que coloca por terra de certa forma que o pensamento de Nietzsche consideraria estratificações sociais como determinantes dentro do contexto de sua crítica a moral dos fracos e fortes e se pudéssemos falar em algum tipo de determinação do homem essa se daria através do jogo e poder no sentido de se afirmar como podem se afirmar, através daquilo que Nietzsche chamará de vontade de potência presente em qualquer organismo vivo.

  
Nietzsche e Marx um diálogo possível?

  Diante deste contexto já abordado e agora diante destes dois pensadores, podemos inicialmente notar que ambos compartilham de uma mesma experiência histórica, representam uma mudança decisiva no modo de compreender o homem, a cultura, a sociedade e o poder. Mas o que há de mais peculiar, é que possuem uma perspectiva muito próxima referente a constituição do sujeito e do pensamento. Marx e Nietzsche concordariam que o ser humano não é algo acabado, fixo e que não há uma natureza humana inata. O homem não é fruto de um ideal autossuficiente e incondicionado. Dentro deste contexto como poderíamos traçar aspectos relacionais mesmo que breves que nos coloque em uma relação paradoxal, porém não menos necessária entre Nietzsche, Marx e o anti-intelectualismo vigente?
   Mas antes precisamos falar um pouco sobre Marx, é notável que diante de um dos diagnósticos marxianos como possibilidade, falo em possibilidade pois Marx considera duas vias possíveis dentro de sua proposta. por exemplo no panfleto do manifesto comunista, texto fundamental pra entender a linha de raciocínio marxiana, diante de uma possível superação dos aspectos de classe, que são; a revolução do proletariado ou a inexistência de qualquer tipo de reação daqueles que se consideram oprimidos e como consequência a anulação da classe do proletariado. Para Nietzsche este comportamento “revolucionário” seria um tipo de manifestação de uma má digestão psicológica de um povo oprimido que se considera ou quer se considerar bom ou superior por conta das divergências e diferenças em relação a aquele que o oprime, então aqueles que além de possuírem moral de escravos( proletariado) por terem sofrido um tipo de derrota histórica e se tornarem ressentidos( o que não faz automaticamente daqueles que estão na predominância a época da crítica de Marx sujeitos com valores mais interessantes para Nietzsche) com valores que nutrem um tipo de movimento fisiológico doente que tenta se afirmar acerca do mundo da maneira que pode, ainda assim direcionando sua vontade de potência diante daquilo que não faz parte do seu contexto hereditário de constituição fisiológica e passa a entender algo fora  si de forma odiosa, e isso também serve para a relação inversa ou seja a visão da burguesia em relação ao proletariado.

Até agora os homens sempre formaram ideias falsas sobre si mesmos, sobre aquilo que são ou deveriam ser. Organizaram suas relações mútuas em função das representações de Deus, do homem normal etc., que aceitavam. estes produtos do seu cérebro acabaram por os dominar; apesar de criadores inclinaram-se perante suas próprias criações. Libertemo-los, portanto, das quimeras, das ideias, dos dogmas dos seres imaginários cujo jugo os faz degenerar. (Marx- Ideologia alemã, pág. 5)

   Pressupomos que Nietzsche entenderia este diagnóstico de Marx como um tipo de idealismo imanente que nega possivelmente a vitalidade como característica primordial para toda a história a humanidade através de uma diminuição do homem que nega para si uma vida saudável e que se nega a afirmar a bestialidade a afirmando apenas naquele que o domina, deixando claro que isso serve aqui tanto para a crítica aos possíveis revolucionários inspirados por Marx tanto quanto para aqueles que tentaram manter sua hegemonia neste período de análise marxiana a qualquer custo, ou seja os “privilegiados” neste contexto histórico a partir de 1848 data de publicação de o manifesto do partido comunista. Pertinente a esta contextualização poderíamos fazer um paralelo do que seria interpretar a realidade para Nietzsche e para Marx, em Nietzsche a interpretação é sempre inacabada o que acaba constituindo um tipo de aporia dentro da possibilidade de se constituir um tipo de “realidade” e dito isto interpretando uma das frases mais famosas de Marx “é preciso não só interpretar o mundo mas muda-lo” haveria uma distinção clara entre interpretar e a possibilidade de mudar a realidade. Porém neste contexto tomamos a famosa frase como uma crítica a postura filosófica daquele tempo e dentro da crítica epistemológica que Marx pretendia fazer a esta mesma postura econômica e política ele sempre se refere a ela como um modo de interpretar nocivo pois esta postura tomava o mundo através de um tipo de significação e a interiorizava como uma apreensão da realidade como regra, eis aqui mais uma aproximação entre estes dois pensadores o problema de totalizar um sentido través do observador.
    Há um outro problema diante das interpretações das determinações históricas em Marx que tendem a ser limitadas por seu período de análise e suas categorias ligadas ao contexto do materialismo histórico que acaba por criar espantalhos aterrorizantes acerca do suposto “marxismo cultural” que termina por direcionar análises precipitadas e que terminam conduzindo nossos compatriotas adeptos de um tipo de populismo de direita anti-intelectual. para agirem de forma igualmente ressentida dentro do nosso contexto atual político brasileiro, através de justificativas obscurantistas, uma delas afirma que o marxismo cultural seria um tipo de exercício de dominação cultural massificadora. Há sim até pressupostos válidos nesta afirmação, a grosso modo sim a proposta de Marx em seu materialismo histórico era de uma possibilidade de influência cultural de conscientização populacional da condição alienadora do trabalhador e que incitava um modo de se comportar reativo, porém este contexto de análise foi constituído no período de análise em que Marx pode ver ou seja ele não pode ver a solidificação do contexto capitalista e toda a sua teoria não daria conta  de uma análise de conjuntura atual, porém isso é muito diferente de dizer que suas contribuições são descartáveis e ainda mais perverso entender toda a riqueza de pensamento contida em sua teoria como algo estático pois seu método epistemológico invoca sempre uma constante mudança de perspectiva de acordo com o período mais complexo em atividade que chamaremos aqui de presente para o mais simples, passado.

       Colocadas as devidas críticas parciais que Nietzsche faz as vertentes de pensamentos influenciadas por Marx, devemos agora reconhecer certos determinismos que descaracterizam tanto a filosofia do próprio Marx tanto quanto uma aproximação epistemológica entre estes dois pensadores alemães tão antagônicos, o que na nossa visão empobrece uma visão teórica e política mais profunda. Em Marx não há determinação teórica, um erro grave cometido por interpretes simplórios ou mal-intencionados, o que há é uma determinação da análise histórica de acordo com o período analisado por Marx, para Marx assim como para Nietzsche não poderíamos cristalizar sentidos interpretativos de determinados contextos históricos ou através de deslocamentos de interpretações de um determinado contexto histórico para outro, para Marx é necessário analisar o contexto histórico de acordo com a atualidade sempre em deslocamento do período mais complexo para o período mais simples ou seja questionando o passado a partir daquilo que nos tornamos hoje, procurando a fundo as constituições das relações sociais econômicas e políticas. Nietzsche por sua vez não busca uma aceitação transportada de interpretações estabelecidas como fixação através de uma moral imaginária que acaba por se tornar um tipo de ética real, mas sim fazer uma genealogia dos sentidos interpretativos e históricos como se constituíram como se transvaloraram e como podemos transvalora-los pra podermos assumir uma perspectiva de não negação da vida saudável assumindo a nossa constituição fisiológica que tende a se afirmar por vezes de forma violenta inclusive em relação a nós mesmos e como talvez poderíamos lidar com isso, uma afirmação de Nietzsche que resume bem o contexto de nossa análise é; que o homem mais forte é aquele que não se importa com as pragas que o atormentam e o mais fraco aquele que se vinga imaginariamente delas.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Aristóteles o conhecimento e suas causas, metafísica, Ciência do Ser e o uno, teologia.


  • O Conhecimento suas causas e suas características gerais;
  • Aristóteles diz que os indivíduos humanos têm intrinsecamente o interesse a cerca do conhecimento, inicialmente esse processo se dá através dos sentidos, talvez principalmente através da visão, não necessariamente focando na ação, ou na utilidade deste sentido. Segundo Aristóteles em a metafísica o sentido da visão é o que traz maior possibilidade a cerca do conhecimento das coisas e maior esclarecimento a cerca da multiplicidade.
  • Aristóteles faz o comparativo entre o humano e os outros animais afirmando que o restante das categorias não humanas vivem com base em lembranças atreladas a sensações não racionais e são incapazes de lembrar de uma maneira estruturada , havendo uma redução drástica na capacidade de adquirir experiência.
  • Diferentemente o ser humano é capaz de adquirir conhecimento através da experiência e da capacidade de recordar de forma racional. 
  • A partir destas experiências o homem fundamenta saberes como a ciência e a arte, pois baseado em uma afirmação do sofista Pólo em um dos diálogos de Platão intitulado Górgias que afirma; " a experiência produz arte , mas a inexperiência acaso" Aristóteles fundamenta que a partir das mais variadas formas de experiências é que se pode chegar em uma concepção final ou universal relativa a objetos semelhantes.
  •  Aristóteles afirma ainda que a experiência é mais fundamental que a teoria pois de forma prática é verificável que podemos visualizar homens que se relacionam com a experiência de forma mais ativa obterem mais êxito em determinada área de atuação que  indivíduos que dominam apenas a teoria.
  • De modo que o indivíduo da teoria supostamente conheceria o universal sem conhecer o particular que só pode ser verificável a partir do contato da experiência.
  • O estagirita  afirma ainda que a busca pelas questões ligadas ao conhecimento de forma "sábia" não esta atrelada a sua utilidade prática ou utilitária e sim está ligada a capacidade de superar as percepções dos sentidos de forma que pudéssemos ir aos fundamentos das sensações e explica-las ou ao menos se propor a isso, por exemplo as ciências exatas que segundo o estagirita surgiram não de uma praticidade e sim as vizinhanças do Egito pois havia um ócio ligado ao lazer e que era focada na  transmissão de conhecimento que seria o mais adequado em se tratando do próprio conhecimento científico . De modo que ao tratar de sabedoria Aristóteles se refere a capacidade de investigação ou reflexão além dos sentidos ou além do senso comum como conhecemos atualmente, ou seja quanto mais universais os conceitos mais difíceis são de serem apreendidos pelo senso comum. A busca em relação a este conhecimento universal que pressupõe cada particularidade de premissas deve ser feita segundo a filosofia aristotélica de modo que seja desejável a si mesma trazendo uma aproximação muito maior do cognoscível se aproximando da perfeição do conhecimento, que está intrinsecamente ligada a questão das causas primeiras podendo assim serem conhecidas e não somente através de suas particularidades . Desta feita  não é por um benefício externo que se busca o contato com o conhecimento segundo Aristóteles pois ao ponto do surgimento da filosofia ou das especulações filosóficas pressupunha atividades recreativas. Então se o que se busca ao estudar Filosofia é fugir a uma parcela da ignorância é evidente que o que se busca é por amor ao conhecimento , baseado no surgimento do que se tem registro do pensamento filosófico ou científico e a proximidade de uma busca da causa primeira está intimamente ligada a esta noção básica.
  • Definição da metafísica como ciência do ser enquanto ser.
  • O que Aristóteles quer dizer com ciência que investiga o ser enquanto ser? Essa definição não está ligada a investigação diante de nenhuma ciência particular pois nenhuma delas procura se ocupar com a questão do ser de maneira geral e fundamental, essas ciências na realidade se preocupam mais com os entes deste ser que propriamente com a essência substancial do ser enquanto ser. Esta busca desse ser está atrelada a investigação dos entes enquanto parte do ser mas nem sempre como parte fundamental do ser mas devem servir de subsídio para encontrar as primeiras causas. É necessário neste sentido de acordo com a metafísica que façamos um traçado a cerca do problema da substância ligada às questões do mesmo e do diferente, o que pode ser caracterizado como igual a ele mesmo e inversamente diferente ? Por exemplo como saber se Sócrates sentado é igual ou diferente a Sócrates? Desta feita há uma ciência que investiga essas causas primeiras ligadas ao uno ou ao múltiplo que segundo Aristóteles é a ciência do ser enquanto ser ou para nós a metafísica ou a filosofia primeira que investiga inclusive as questões do não ser que é aquilo que antecede a matéria se descolando do dualismo platônico ligado a um mundo inteligível, para o estagirita sensível e inteligível podem ser verificados a partir de uma experiência investigativa atrelada a sensibilidade mas não só a ela, para Aristóteles por exemplo não existe a ideia de branco, se por um acaso o branco de forma manifesta sumir do mundo prático não resta a ideia originária de branco que seria o branco real segundo a visão de Platão, para Aristóteles isso é apenas uma abstração atrelada ao não ser ou princípio de ser.
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domingo, 8 de maio de 2016

Jean Paul Sartre - O existencialismo é um humanismo

  "O existencialismo é um humanismo", é um texto escrito por Jean Paul Sartre no ano de 1946, visando esclarecer o pensamento existencialista e principalmente defendê-lo de uma série de criticas. Nele, Sartre começa relatando as críticas dos comunistas, que acusavam o existencialismo de incitar as pessoas a permanecerem no imobilismo do desespero; de ser uma filosofia contemplativa, o que necessariamente o reconduziria a uma filosofia burguesa; de enfatizar a ignomínia (vergonha) humana e de negar a solidariedade humana. Sartre ainda dá destaque para as críticas cristãs, que os acusavam de negar a realidade e seriedade dos empreendimentos humanos, já que supriminndo os mandamentos de Deus e os valores inscritos na eternidade, restaria apenas a pura gratuidade, onde cada qual poderia então fazer o que quiser, sendo impossível a partir de um ponto de vista pessoal condenar os pontos de vistas alheios tal qual os seus atos. 

     Após expor tais críticas, Sartre tenta explicar em que sentido eles(s) entendia(m) o existencialismo, numa tentativa de responder as acusações feitas acima. Ele começa afirmando que o concebia como uma doutrina que torna a vida humana possível e que, por outro lado, declara que toda verdade e toda ação implicam um meio e uma subjetividade humana. Segundo Sartre, existem dois tipos de existencialismo: O existencialismo cristão e o existencialismo ateu, que segundo ele é o mais coerente. Entre o existencialismo cristão e o existencialismo ateu, o único ponto de concordância é o de que a existência precede a essência, ou seja, que é necessário partir de uma subjetividade. Porém, Sartre crítica o existencialismo cristão, destacando sua incoerência em relação à subjetividade. Em uma analogia, Sartre compara Deus com um artífice que ao fabricar um objeto sabe exatamente para qual finalidade o está fabricando, ou seja, já possui uma utilidade definida. Desse modo é impossível relacionar a finalidade do ser com a sua subjetividade, tendo em vista que a finalidade é algo necessariamente objetivo e se opõe totalmente ao conceito de subjetividade. Por outro lado, o existencialismo ateu, dito por Sartre como o mais coerente e por ele defendido, declara que Deus não existe e que a existência precede a essência. Desse modo, primeiro é necessário o ser existir para só depois poder ser definido por qualquer conceito. Isto significa que o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo, e somente depois se define. Logo, não há natureza humana, visto que não há Deus (artífice) para concebê-la. Sendo assim, o homem é simplesmente aquilo que ele faz de si mesmo, não sendo nada mais do que isso. O homem é antes de tudo um projeto que vive subjetivamente, nada existe anteriormente a ele, de modo que o homem será antes de qualquer coisa, aquilo que ele escolher ser. Assim, o primeiro esforço do existencialismo, segundo Sartre, é o de colocar o homem no domínio do que ele é e de lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência. 

         Neste sentido, Sartre afirma que o homem não é apenas responsável unicamente por si, mas que também é responsável por todos os homens. Ele afirma ainda que a palavra "subjetivismo" possui dois significado: Escolha do sujeito individual por si próprio e impossibilidade em que o homem se encontra de transpor os limites da subjetividade humana. E é nesse segundo sentido, segundo Sartre, que se constitui o sentido profundo do existencialismo: "Ao afirmamos que homem se escolhe a si mesmo, queremos dizer que cada um de nós se escolhe, mas, queremos dizer também que, escolhendo-se, ele escolhe todos os homens". Desse modo, todos os nossos atos que criam o homem que queremos ser, estão simultaneamente criando a imagem do homem tal como julgamos que ele deva ser. Escolher ser isto ou aquilo é afirmar, concomitantemente, o valor do que estamos escolhendo, pois não podemos nunca escolher o mal, o que escolhemos é sempre o bem e nada pode ser bom para nós sem o ser para todos. Se, por outro lado, a existência precede a essência, e se nós queremos existir ao mesmo tempo em que moldamos nossa imagem, essa imagem é valida para todos e para toda nossa época. Portanto, a nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor, pois ela engaja a humanidade inteira. 

         Porém, quando o individuo se der conta de que ele não é apenas aquele que ele escolheu ser, mas também é um legislador que escolhe a si e a humanidade inteira, este não consegue escapar do sentimento de sua total e profunda responsabilidade, envolvida pelo sentimento de angustia, desamparo e desespero. Tudo se passa como se a humanidade inteira estivesse com os olhos fixos em cada homem e se regrasse por suas ações. E cada homem deve perguntar a si próprio: sou eu, realmente, aquele que tem o direito de agir de tal forma que os meus atos sirvam para toda a humanidade? Todos vivem essa angustia e apesar de que alguns a disfarça, para Sartre, estes são os mascarados que agem de má fé, que pensam que suas ações envolvem apenas eles enquanto indivíduos, e quando são confrontados com a pergunta: e se todos fizessem o mesmo?, eles encolhem os ombros e respondem: nem todos fazem o mesmo. Ao que ele afirma: "Aquele que mente e que se desculpa dizendo: Nem todo mundo faz o mesmo, é alguém que não está em paz com a sua consciência, pois o fato de mentir implica um valor universal atribuído à mentira, mesmo quando ela se disfarça, a angustia aparece. Para Sartre, essa angustia não conduz a inatividade, a inação, pelo contrario, essa angustia é a própria condição da ação, que se orienta pela pluralidade de possibilidades, sentida por todos que já vivenciaram responsabilidades, e quando escolhem uma opção se dão conta que ela só tem valor por ter sido escolhida. Ao falar de desamparo, Sartre cita o pensamento de Dostoievski: " Se Deus não existe, tudo é permitido", afirmando ser este o ponto de partida do existencialismo. De fato, segundo ele, tudo é permitido, e por conseguinte, o homem está desamparado porque não encontra nele próprio e nem fora dele, nada para se agarrar. Para começar, não encontra desculpas. Com efeito, se a existência precede a essência, nada poderá jamais ser explicado por referencia a uma natureza humana dada e definitiva, ou seja, não existe determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade. Por outro lado, sendo Deus inexistente, não encontramos, já prontos, valores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta. Assim, não teremos nem atrás de nós nem na nossa frente, nenhuma justificativa e nenhuma desculpa. Estamos sós, sem desculpas, condenados à liberdade. Condenado porque não nos criamos a nós mesmo, e como no entanto, somos livres, uma vez lançado no mundo, somos responsáveis por tudo que fazemos, e aqui se configura o terceiro sentimento, o sentimento de desespero. 

            Após essa série de esclarecimentos, Sartre acredita ter respondido às criticas feitas pelos comunistas e cristãos. Salientando mais uma vez que o existencialismo não pode ser considerado como uma filosofia da quietude, já que define o homem pela ação; nem como uma descrição pessimista do homem: "Não existe doutrina mais otimista, visto que o destino do homem está em suas próprias mãos"; nem como uma tentativa de desencorajar o homem a agir: "O existencialismo diz-lhe que a única esperança está em sua ação, e que só o ato permite o homem a viver”. Porém, apesar de tudo, o existencialismo ainda era acusado de aprisionar o homem na sua subjetividade, acusação esta que Sartre associou a uma má interpretação.  Ele, em resposta a esta acusação, assume mais uma vez que o existencialismo de fato tem como ponto de partida a subjetividade do individuo, justamente por ser uma doutrina que tem como base a verdade, realista, contrária às teorias utópicas, bonitas, baseadas em esperanças, mas se fundamentos reais. Como ponto de partida, Sartre afirma que não poderia existir outra verdade se não esta: penso logo existo; pois é aqui que o ser apreende a verdade absoluta da consciência e toda teoria que considera o homem fora desse momento em que ele apreende a si mesmo é, de partida, uma teoria que suprime a verdade, pois, fora do cogito cartesiano, todos os objetos são apenas prováveis e uma doutrina de probabilidades que não estejam ancoradas na verdade, desmoronam no nada. Porém, essa subjetividade não é rigorosamente individual porque, como diz Sartre, demonstramos que no cogito nós não descobrimos só a nós, mas também aos outros. Nestas condições, a descoberta da minha intimidade descobre-me ao mesmo tempo o outro como uma liberdade posta em face de mim (já que também sou livre), que nada pensa ou quer senão a favor ou contra mim. Assim, descobre-se imediatamente um mundo que Sartre chamou de intersubjetividade, sendo neste mundo onde o homem decide sobre o que ele é e o que os outros são. Por consequência, todo projeto, por mais individual que seja, tem um valor universal, e é compreensível para todo homem, não o definido, mas podendo se reconhecido. Neste sentido, pode-se dizer que há uma universalidade no homem; mas ela não é dada, é indefinidamente construída. Constrói-se o universal, escolhendo-se, compreendendo o projeto de qualquer outro homem, seja qual for a sua época. 

             Sartre finaliza seu ensaio falando acerca do humanismo e fazendo a relação deste com o existencialismo. Ao falar sobre o humanismo, ele destaca que existem dois tipos destes, um humanismo que toma o homem como meta e como valor superior, este totalmente rejeitado por ele, e outro que no fundo é o seguinte: o home está constantemente fora de si mesmo; é projetando-se e perdendo-se para fora de si que faz com que o homem exista; por outro lado, é perseguindo objetivos transcendentes que ele pode existir. Não existe outro universo além do universo humano, o universo da subjetividade. Este é o humanismo que Sartre adota, e é a este vinculo entre a transcendência e a subjetividade que Sartre chama de humanismo existencialista. Humanismo porque não há outro legislador além dele próprio e que é no desamparo que ele decidirá por si mesmo, mas, voltando sempre para fora de si, vivendo o mundo dos meios, porém, buscando fora de si o fim. Concluindo, Sartre afirma que o existencialismo é um esforço para tirar todas as consequências de uma posição ateia coerente. O seu objetivo não é mergulhar o homem no desespero, mas, ele parte do desespero original do homem, que é a atitude de descrença. Segundo Sartre, o existencialismo não é um ateísmo no sentido de que se esforça para por demonstrar que Deus não existe. Ele afirma que o problema não está em sua existência, mas em que o homem deve se reencontrar e se convencer que nada pode salvá-lo de si mesmo, nem mesmo uma prova válida da existência de Deus